A razão de ser

                

Na primeira vez no Ceará, eu desconhecia o mar forte. Anos de litoral paulista me fizeram acostumar com um mar tranquilo, com ondas seguras, que com sua força amena me permitiam mergulhar, nadar ou só pular mesmo. Mas o mar do verão cearense estava longe de ser assim. Na primeira que nadei, ainda no raso, a água me puxou de forma tão violenta, que eu girei tão qual um peão da Tele Sena e ralei minhas costas, pernas e braços. Somente com a ajuda de um amigo é que eu consegui me levantar e assim não me afogar.

Esse episódio engraçado, embora perigoso, me ajuda a ilustrar o que foi 2024. Posso dizer que a chegada de 2025 foi uma momento muito esperado. Mais do que celebrar um novo ano, criar listas e planos, elencar as metas, definir o que vai ser feito, a chegada de 2025 me era muito esperada. Pra mim, estar em 2024 foi como estar presa eu um pesadelo que não tinha fim. E isso não foi somente pelos acontecimentos do primeiro semestre, mas é porque a cada mês um novo problema surgia e me deixava mais fragilizada. A parte boa é que eu já não esperava mais nada de positivo, então tudo isso foi uma sequência de ondas fortes do mar, em que eu só me preocupei em tapar o nariz e boca pra não morrer afogada. Foi como estar no mar do Ceará pela primeira vez.

E graças à Deus, aos anjos, ao cosmos, ao universo, ao meu orixá, 2025 até aqui tem sido um ano maravilhoso! Depois de muita dúvida e questionamento quanto à mim mesma, eu pude entregar minha tese. Celebrar meus 29 anos também foram um marco importante, embora atravessado por algumas crises. Fui (finalmente) pedida em casamento, de um jeito lindo e emocionante <3 E, talvez o mais importante, a compra do meu apartamento dos sonhos está quase certa, faltando realmente muito pouco!

É claro que, depois de 2024, o ano da pedreira, uma das lições que aprendi foi de que as conquistas pessoais, embora importantes, não são o definidor da minha personalidade. É essencial que eu possa me sentir bem com tudo isso. E, infelizmente, tenho exemplos que ilustram que nem sempre as grandes conquistas da vida, como é o caso de comprar um imóvel (no Brasil, país em que comprar um teto pra morar é extremamente difícil), vem acompanhado da aguardada felicidade.

O que eu aprendi com 2024 foi a respirar e a apreciar a beleza mesmo que no meio do caos. Sendo assim, confesso que é difícil às vezes sentir a plenitude no meio de tanta felicidade. Eu acho que isso é bem perigoso: tal qual a tristeza pode ser um ambiente confortável e que seja difícil querer sair de lá, não apreciar os momentos bons pela afobação, por se comparar ou por não enxergar a sua realização como uma coisa grandiosa, pode ser um conforto também, embora desconfortável. E pra mim tem sido uma constante tarefa não me sentir assim.

Evidentemente que eu me sinto muito foda com tudo isso acontecendo, mas talvez eu tenha resquícios do trauma e do luto nisso tudo. Os acontecimentos e reviravoltas de 2024 são a prova disso. Por exemplo, meu sonho era imigrar e conseguir um emprego bom no exterior, mas depois isso se tornou insosso e até um pesadelo (hoje, inclusive, tive uma amostra do porquê eu vim embora sem olhar pra trás. A frieza do hemisfério norte está muito longe de estar atrelada somente ao clima). A morte da minha mãe, por sua vez, me causou uma espécie de ferida sensível, tal qual um dente que ameaça a doer consideravelmente no primeiro contato com um sorvete gelado. É como se todas essas conquistas fossem um gelato italiano, mas que ao primeiro contato com meus incisivos, me causam uma dor levemente agonizante, que me lembra que talvez eu não esteja preparada pra tanta felicidade e que as alegrias sempre serão acompanhadas de alguma dor, ainda que ligeira.

Sinto que daqui pra frente eu serei só 90% feliz. E não somente porque me é muito triste viver todas essas conquisas sem minha mãe do lado, mas porque essa perda fez morrer algo bem iluminado dentro de mim. Como o bocal que queimou de forma irreversível e nenhuma lâmpada, por melhor que seja, possa acender neste local.

Então, eu devo seguir assim mesmo, porque não nos resta outra alternativa. É como li de Clarice ontem, a morte me parece uma vantagem e eu vejo que, a cada ponto de felicidade que não me atinge, é como se uma parte minha estivesse amadurecendo e desprendendo deste plano. Incrivelmente eu não interpreto isso como algo triste. Pelo contrário. Desapegar deste mundo se torna uma parte essencial para estar pronto para o outro plano. E sobre isso, é inevitável se preparar, pois independentemente se eu quiser ou não estar preparada,  o morrer chegará. De um jeito ou de outro. É melhor se acostumar com a ideia.

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