O lidar com os sentimentos
Escrever para mim tem sido um bálsamo. E não só escrever em meu diário, sobre coisas cotidianas. Escrever como forma de dar vazão e nome ao que eu sinto. Colocar no papel aquilo que dentro de mim é tão gigante, mas quem em um papel ou em uma tela se torna palpável. E pequeno.
Estou passando por intensas mudanças e isso não é de hoje. 2024 tem sido de longe o ano mais horrível de todos e cada dia é um aprendizado novo. Quando penso que as coisas vão se acalmar, vem uma nova tempestade e exige mais força de mim. Mas eu não tenho um estoque gigantesco de força. Talvez nem um container ou uma piscina olímpica. Eu tenho uma caixa d'água residencial. É isso.
E como um objeto que comporta algo tão finito, hoje eu me vi sem forças diante de situações que antes seriam corriqueiras. Eu sei que isso é resquício do luto e sei por que quando me vi triste, eu senti o mesmo desamparo que senti ao perder minha mãezinha. Aquela sensação que é tão única, tão dura e que você distingue de longe: eu estou sozinha no mundo. Essa perda eu nunca vou superar. Acho que é por isso que passei pelos estágios de abandonar parte dos meus sonhos e alterar todo o curso da minha vida, porque as coisas disassociam e deixam de ter razão. Bom, é só ler cada um dos poucos textos que escrevi esse ano.
Parte do meu planejamento de volta ao Brasil foi encontrar um emprego melhor. Eu gosto muito do que eu faço, mas sinto a necessidade de mais desafios, de aplicar na prática o que eu venho estudando tanto a duras penas. Eu estudei muito nestes últimos anos e tornou-se parte de um sonho encontrar um emprego à altura deste empenho. É claro que eu amo minha vida enquanto autônoma, basta olhar o tanto que viajei enquanto trabalhava nestes anos. Mas eu precisava de mais e o retorno definitivo pro Brasil englobou esse plano.
Eu sabia que a busca ia ser cansativa, densa, desgastante, cheia de questionamentos. Sabia que enviaria 100 currículos, teria 40 retornos, faria 10 entrevistas e receberia 2 feedbacks. Isso eu estava ciente. Mas hoje em especial ocorreu algo que eu não contava e que me deixou chateada.
Somado a isso, uma das amigas que eu imaginei que pudesse contar, que sempre foi tão sensível e compadecida com minhas dores, deixou de me ajudar quando eu pedi. Isso em um momento em que eu desabafei sobre quão delicado era trabalhar e conviver com o luto. Honestamente, o fato me deixou muito chateada e fragilizada, porque eu nunca peço ajuda pra ninguém. Sei que não posso controlar o que os outros fazem ou deixam de fazer, mas eu posso lidar com meu sentimento. E o meu sentimento agora é de tristeza.
Sei que tenho esse comportamento típico, de ficar extremamente triste e desolada quando algo sai do meu controle. Mas sei também que eu me reergo muito rápido também, faço vários planos em seguida e coloco em ação tão logo eles surgem na minha cabeça. O mestrado foi assim, o escritório também. A mudança de volta pro Brasil, os planos do apartamento, as viagens que já fiz, todas foram fruto de uma decepção anterior que se convertou em vontade de fazer algo dar certo.
Tenho ciência que a gente deve sim reclamar, falar o que sente, ficar triste quando quiser. Não dá pra sair reprimindo tudo porque é muito pouco pra ficar triste. Foi horrível ser deixada de lado em um momento de tanta fragilidade e diante de um pedido de ajuda? Nossa, foi demais, não posso negar. Também foi horrível receber esse comportamento? Sim, a expectativa era alta e não era pra menos. Como diz minha analista, a gente precisa ter expectativa senão nem sai da cama. Me dá muita raiva quem defende que a gente não pode ter expectativa. Se eu não espero algo de bom disso, eu nem tento, né? E se der errado o que a gente espera, a gente fica frustrado, fica bravo, chora no banho, chora com as amigas, reclama com o namorado, escreve no blog, escreve no diário. Daí passa. Daí a raiva fica pequena, ainda que ela exista ainda. Mas ela vai dissipando, até que vira fumaça.
Eu sei disso porque é assim que eu venho lidando com a morte da minha mãe. Alguns dias eu fico muito triste e deixo a tristeza ficar aqui, não expulso ela não. Tem outros dias que eu quero lutar, mas sei que a tristeza uma hora me vence, de um jeito ou de outro. Então, quando o luto vem, eu me preparo, faço um chá para ele, me visto de um jeito confortável e deixo a tristeza ficar. Nem coloco vassoura atrás da porta. Uma hora ele vai embora. Se eu brigar, vai ser pior, porque ela vai demorar muito mais pra sair.
Então, vamos acolher os sentimentos. Sem falsa positividade, sem falar "tá bom, podia ser pior". Sem reprimir. Vamos ficar tristes, mas vamos ficar felizes também pelas coisas. No final, a gente não leva nada daqui. E o que estamos fazendo é dar um sentido na vida, que já é cruel demais.
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